domingo, 5 de junho de 2016

Lucas Viriato

Lucas Viriato é um poeta, tradutor, editor e produtor cultural nascido no Rio de Janeiro em 1984. Graduou-se em Letras pela PUC-Rio e obteve o título de mestre em Literatura Brasileira na mesma universidade. 
Desde 2006, edita o jornal literário Plástico Bolha, que já publicou centenas de autores, entre novos e consagrados. 
Lançou os livros  Memórias Indianas (2007), sobre sua primeira viagem para a Índia, e Retorno ao Oriente (Rio de Janeiro: 7 Letras, 2008), que continua a narrativa poética sobre o leste do mundo, além de Contos de Mary Blaigdfield, a mulher que não queria falar sobre o Kentucky - e outras histórias (Rio de Janeiro: 7 Letras, 2010), Antologia de prosa Plástico Bolha (organizador, 2010), Curtos e Curtíssimos (2012), Muestras (2013), Corpo Pouco (2013) e a Antologia de poesia Plástico Bolha (2014). 
Após passar pelo "CEP 20.000", onde trabalhou com o poeta Chacal, organizou eventos como o "Labirinto Poético" e o "Estação Nordeste" para a Cidade das Artes e a Prefeitura do Rio. 
Seu trabalho mais recente foi a curadoria da exposição "Poesia Agora", no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, no ano de 2015, e a tradução do livro O estranho mundo de Jack, de Tim Burton, publicado este ano pela Editora Cobogó.
Já participou de diversos festivais de poesia pela América Latina e recebeu, em 2012, o prêmio Agente Jovem de Cultura, concedido pelo MinC.
Sua escrita é urbana, marcada pelo compasso da fala e pela conversa com pensamentos e personagens interiores quase sempre representados por paisagens, objetos ou criaturas.



Origamis urbanos


ao explorar cidades estranhas
encontrar-me não é o pior
se faço consulta cartográfica
uma séria pergunta me assola

mas por que há de ser tão difícil
dobrar novamente um mapa?
questiono o quanto aguentarão
suas juntas até se soltarem

em quadrados avulsos — enfim
novo planejamento urbano
a cada vez que fico perdido

mais difícil é dobrar o mapa
como se uma cidade não se
comprimisse assim, impunemente


#


Parada obrigatória

A saída abrupta do Coffee Shop desestabiliza cones
         e bastonetes fazendo do traçado pincelado da cidade um enorme quadro de Van Gogh.
Estruturas de tijolos vermelhos e letreiros luminosos andam ritmicamente para trás deixando o trem imóvel em seu lugar.
A solidão desoladora de uma bicicleta esquecida
         em frente à lanchonete onde é servido lixo temperado em gavetas.
Em cada esquina um mictório público insinua-se como o maior monumento à dignidade já erguido
         pela Civilização Ocidental.
Três X em seu brasão antecipam seu filme pornô, seus disparates, suas putas emolduradas em luz vermelha chamando com o dedo indicador.
Cruzo o museu com nome de espirro que um amigo jura já ter ido comigo, mas que só fui pela primeira vez dois anos depois.
Esse Vondelpark é vasto demais e as coisas do Moacir Santos tocando em meus ouvidos fazem florescer os fungos transcendentais.
Passeio errático por infinitas pontes arqueadas cruzando simétricos barcos nos quais sei que nunca irei morar.


#


Em Lisboa

Vejo às margens deste Tejo,
vindo a flutuar, senil,
a lembrança de um beijo
que jamais aconteceu.

Eis que uma gaivota branca
chegada não sei de onde
com fino bico a apanha –
sai voando para longe.

Ei! Devolva-me, gaivota!
Mesmo que não seja jovem,
quero essa minha memória.

Pois dentro de todo homem
há sempre lugar na história
Para aquilo que não houve.




Aldeia Velha

despenco
como um barranco
aberto em beira de estrada
pelos pastos ressecados
meus desejos, os bois magros
nosso projeto, aquele ipê
derretendo amarelo
idéias que piscam no escuro
erodir por completo
aos urubus minha carcaça
resta somente o ipê
amarelo como um farol
em nossas insustentáveis
pastagens

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