quarta-feira, 9 de maio de 2018

Raquel Gaio


Raquel Gaio nasceu e reside no Rio de Janeiro. 
Possui dois pássaros presos no centro do seu diafragma. Eles mastigam um novelo vermelho que nunca acaba.
Visite sua página.



Abaixo seguem quatro poemas inéditos de seu livro Das chagas que você não consegue deter ou a manada de rinocerontes que te atravessam pela manhã, publicado pela editora Patuá a ser lançado neste mês de maio, no dia 15, em São Paulo, e no dia 02 de junho, no Rio de Janeiro.


Serviço do lançamento em São Paulo:
O lançamento será realizado no dia 15 de maio (terça-feira) a partir das 19h no Patuscada - Livraria, Bar e Café, no endereço Rua Luís Murat, 40 - Vila Madalena - São Paulo – SP.
A entrada para o evento é gratuita e o exemplar estará à venda por R$ 38,00 (pagamentos em dinheiro e cartões de débito e crédito). 
Clique AQUI para visualizar o evento.







ele, o rinoceronte, guarda no ventre
todas as promessas não cumpridas
ele tem o bucho róseo, cheio de começos

viajo sempre de teu pau ao meu abandono
estou coberta de não direções
tentei avisar do grande exílio que estava por vir,
mas já nascias com queimaduras nos braços

estou acumulada no tempo
espreito sempre o demônio das coisas

tenho sete costelas viradas para o inferno

quando amanheces verdadeiramente de ti?
onde estão guardados os dentes quebrados da infância?

me trafico nas praias escuras
e não partilho das esperanças dos enfermos

-tenho o bucho pálido como de um operador de máquina-

como é não ter um membro?
o que poderia ter sido e ficou prensado
como desejo contido, parto para sempre adiado
uma rodovia pairando sobre nossas cabeças.




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deveria haver um gelo no meu quadril
que me ferisse, me assombrasse, como uma precisa incisão
e que deixasse apenas meu ventre maduro
menos estúpido, menos pântano

meu quadril é uma f(r)icção
me faz menos osso e menos noite a cada dia

da minha janela
vejo planaltos suando de saudade

tenho entre as mãos
a querência de mil bacantes e o grito surdo de um deus

sei de cordeiros que nunca se satisfazem

um som grave perfura o lirismo da minha bacia
e me abismo

o que sei
é através dos vácuos que ficam nas minhas cavidades.




#




as paredes do quarto são feitas de minhas mortes
estão lá cimentadas as meninas que de mim saíram
de bocas abertas e gestos que invocam perdas
com fetos cravados em suas mãos

toco em minhas extinções como se fosse a única possibilidade de existência
me afundo num terreno onde ninguém mais soma os fracassos.




#




para meus companheiros da residência Nuvem (RJ)
Jefferson Skorupski, Matheus de Simone,
 Pablo Costa, Júlia Milward e Thâmara Cunha,
janeiro 2016.


porque há raízes que nos afogam
somos os animais que extinguimos durante os séculos
estou enterrada como uma pedra que ninguém vê
as roupas estão sujas
e eu já me esqueci dos hábitos cotidianos
porém, não escapo de mim mesma
por entre os galhos
já não sou mais que uma mancha
áspera e exausta

-cavamos pela nossa imortalidade durante toda a manhã-

possuo a feição da demolição por todo o corpo
sou um parapeito de poço

a boca, uma gruta vazia e úmida
o sexo, cidades dissolvidas e escuras
toda uma ausência nos veste

somos como um deus
perdido e sem socorro
na demolição de todos os homens.

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