quarta-feira, 6 de junho de 2018

Gabriel Mação


Gabriel Mação nasceu no Rio de Janeiro em 1995. É poeta e ilustrador. Cursou Museologia pela UNIRIO. Estreou na literatura em 2014 e publicou nas antologias Seis temas à procura de um poema (FLUP, 2017) e Tente entender o que tento dizer: poesia + hiv/aids (Bazar do Tempo, 2018), organizada por Ramon Nunes Mello.

Gabriel se dedica a escrever sobre os desafios da homossexualidade e das vivências homoafetivas na contemporaneidade.
Sua poesia reflete o caos urbano, a violência, o preconceito, os desamores e a beleza (ou o fracasso) dos romances. Seu estilo transita entre a poesia oral, de protesto, e experimentações de forma.

Abaixo, alguns de seus poemas.





Quanto dura o amor

O amor me comeu no sofá da sala
Como um verme devorando
Meus músculos cardíacos

Rasgou minhas roupas
Minha carne
Minha pele suada  
Bebeu como suco de maracujá
Vinho tinto
Café ralo

Eu derramado aos pés dele
As fezes do cachorro
Que se pisa na rua
Esfregada no piso da sala
Entranhado nos móveis
Na casa inteira
Dentro e fora de mim
Caco de vidro cortando
Dos dentes ao reto
Arranhando a superfície lisa
Do copo quebrado

O amor se estilhaça
Com um simples gole
O amor escorrega das mãos
Quando se descobre
Que só dura enquanto
O pau está duro

Ele disse que era…
Amor
Os olhos diziam
Os meus diziam
Depois, quando acabou
Ele virou para o lado
Rígido
Frio

O amor gozou em mim
E foi embora




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Verde musgo

Morcegos na luz do poste
Desejo tuas sombras
Assim
Entre as ruas de Marechal
Seus olhos semicerrados
Penumbra
Nesse sangue que queima
Nossos corpos
O cigarro aceso
Entre barulhos do trem nos trilhos
Sobre nossas cabeças
Miúdos somos
Pequenos
Nessas praças anoitecidas
De lua minguante
Sua casa laranja
Seu quarto branco
O resto pintado de verde musgo
Menino
Não tenha medo desses
Mamíferos frutíferos
Não tenha medo do fino nevoeiro
A caverna já é o mundo
E assim emaranhados
Como um barbante no pulso
O nó na camisinha
A saliva do beijo
Podemos até ser
Um pouco de sol



#




Troféu

No relógio 30 minutos
Para descascar os morros
Que vejo da rua
Você consegue não chorar descascando cebolas? 
Enche os dentes de água
Maré, Avenida Brasil 
Espinha de peixe frito 
jiló à kilo e restos de frutas 
Que ninguém comprou 
Pisoteadas

Cuidado para não tropeçar
Em crianças pedindo moedas
Pedindo mãe arroz feijão
Como língua de boi mastigada

Na feira
Cabeça de porco sangra
Enche a boca de porco
de porcos leitões
Ocupa todos os buracos
Mordidas obturações gastas céu da boca
Eu matei o porco

Agora cospe

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